Nascido no dia 05 de abril de 1588, na cidade de Westport, Malmesbury, nascia um dos maiores estudiosos da área do Direito que o mundo já conheceu. Thomas Hobbes. Ele se dizia ser o “irmão gêmeo” do temor, pois vivera numa época marcada por guerras e disputas por poder (e, principalmente, pelos conflitos envolvendo religião). Posso citar, por exemplo, a Guerra dos Trinta Anos, a Reforma Protestante, etc.
Quando ainda criança, seu pai, um vigário humilde, o entregou a um tio, que lhe proporcionou muito boa educação. Como sempre foi muito interessado, desde os 7 anos já estudava os clássicos de Robert Latimer. Aos 14 anos ingressou na universidade de Oxford, “Magdalen Hall” No ano de 1608, ao terminar seu bacharelado, é indicado para ser o preceptor¹ do filho de Lord Cavendish. Aproveitou-se da função para aprofundar-se nos estudos na biblioteca da casa onde trabalhava. Fez viagens pela França, onde aperfeiçoou seus idiomas. Com o início da guerra civil francesa, Hobbes se exilou voluntariamente em Paris por 11 anos.
É no ano de 1629 que Hobbes passa a demonstrar suas tendências políticas: foi o primeiro a traduzir a obra “A Guerra do Peloponeso”, de Tucídides. Teve a oportunidade, através do Padre Mersenne, de discutir suas ideias com René Descartes e com Galileu Galilei.
Sempre demonstrou grande interesse pelos problemas sociais, e grande defensor de um governo despótico.
A Guerra Civil francesa foi um fato muito marcante na história, pois numa “queda de braço” pelo poder, entre o rei Carlos I Stuart e o seu Parlamento, o rei acaba “perdendo a cabeça”.Sim, pois fora vencido pelo exército e o Parlamento, e no ano de 1649 foi decapitado. Eles tomam o poder e proclamam a república, sob comando de Cromwell. No mesmo ano (1651) Hobbes escrevia “O Leviatã”.
Para se compreender os sentimentos dele, é necessário sabermos de alguns fatos importantes: ele nasceu antes da hora, pois sua mãe se assustou com a “Invencível Armada”.
Síntese do Hobbismo: Pode-se afirmar que o livro é uma síntese do hobbismo porque ali se encontram suas principais ideias. Ele tinha uma visão pessimista sobre a sociedade, que seria movida por paixões, pela irracionalidade. E que na ausência de um poder, os homens entrariam em conflitos intermináveis na luta da obtenção dos meios de subsistência.
Hobbes tenta, através de seu livro, definir o ser humano em seu estado natural, estado de natureza. Segundo ele, que neste estado, não existe soberania, pois todos são donos de tudo, e lutam para conseguir se manter donos do que querem. Isso faz com que não possam ser chamadas essas sociedades de Estados, pois um Estado pressupõe soberania, e a soberania pressupõe a obediência (ao menos o respeito) a uma pessoa, que irá dividir o que pertence a quem, até mesmo para a manutenção da própria sociedade.
Afirma que os homens são sempre inimigos (concorrentes), e que no estado de natureza o homem não tem medo de nada, por isso luta a todo momento pela sua vida, sem se preocupar. É esta ideia que esclarece a frase “homo hominis lúpus”, ou “o homem é o lobo do homem”.
Expõe que em uma guerra perpétua assim, não existe segurança para se viver, vive-se menos e pior. E nestas condições, é impossível qualquer tipo de desenvolvimento.
Para que isso pudesse mudar, Thomas defende que os homens racionais deveriam abandonar o seu estado de natureza e aceitar um poder soberano, que garantiria a sua paz e segurança. Pois somente uma liderança absoluta (soberana) é capaz de manter uma sociedade organizada. Para que um Estado se mantenha, ele tem que ser imponente.
“Porque os pactos ‘sem gládio, sword, não são mais do que palavras, words”.
Capacidade para abandonar este estado de natureza o homem possui, já que algumas de suas paixões o inclinam para a busca da paz (medo da morte, por exemplo). Essas paixões são chamadas por ele de leis de natureza, que são nada mais que o nosso instinto de sobrevivência – são elas que nos levam a buscar a própria conservação e defesa.
Para alguns autores da antiguidade, como Aristóteles, o homem já nascia naturalmente cidadão, sociável. Mas Hobbes contradiz esta versão: ele diz que o homem se agrupa, forma sociedades por puro interesse e necessidade (pois, como diz o bordão, “duas cabeças pensam mais que uma”).
“A sociedade política é o fruto artificial de uma pacto voluntário, de um cálculo interesseiro.”
O que constitui os homens naturais em sociedade política são os contratos, onde cada um aceita abrir mão de todos os direitos que possui sobre todas as coisas para poder viver em harmonia. Este contrato é feito com um terceiro, que representa um meio-termo da vontade de ambos os lados (árbitro, juiz). Este, por sua vez, é totalmente estranho ao contrato - para que não interfira no resultado.
Há dois tipos de contratos descritos pelos teólogos da Idade Média:
· pactum unionis ou societatis (mais tarde chamado de contrato corporativo) : é o direito adquirido perante a sociedade, o restante do grupo;
· pactum subjectionis ou de submissão (contrato individualista): é o contrato que se tem com o Homem Artificial (Estado), onde se aceita a alienação de seus poderes sob certas coisas em benefício do soberano.
. Mas Hobbes tenta transformar a ideia deste dualismo contratual, o tornando um só: para ele, o contrato que fosse firmado o seria feito entre as partes, ou seja, o primeiro e o segundo indivíduos, já estaria aceitando as normas impostas pelo Estado à essa relação e a esses individuos. Neste caso, ao aceitar o contrato, automaticamente se estaria abrindo mão de certas ações e liberdades nocivas à paz.
“Quando o representante é um homem, então o Estado é uma Monarquia. Quando é uma assembléia de todos quantos de unem, é uma Democracia ou Estado Popular. Quando é uma assembléia composta apenas de uma parte dos que se unem, é o que se chama Aristocracia. Não pode existir qualquer outra espécie de Estado, pois é necessário que um, ou todos, possuam o soberano poder que é (...) indivisível, integral.”
Para Hobbes, não importa qual a forma de governo, pois em nada modifica o poder do soberano. A característica primeira da soberania é o respeito mútuo a ela, e a sua indivisibilidade. Ou seja, não se podia discuti-la, pois para alguns autores, discutindo o que era soberania, iria enfraquecê-la.
“Dividir o Poder, é dissolvê-lo.”
Assim dizia Hobbes quando se dizia em governos mistos. Explicava que quando se dividia o Poder, outras tantas facções deste surgiriam. E então deixaria de haver soberania.
Para Hobbes, a única fonte do Direito, das leis é o Estado, o Poder, pois é a expressão da vontade do soberano.
Explica que as leis nunca serão injustas, pois seria contrário à regra do Direito em si. E também pelo simples fato de que provém da vontade do soberano, e o mesmo é absoluto e nunca seria injusto. Daí nota-se a ideia explícita do Positivismo.
Outros autores até mesmo chegaram a negar, mas Hobbes insistiu que o direito de propriedade que muitos diziam ter, na verdade não passa de uma concessão do soberano – pois antes da criação deste Poder comum, não se podia tê-lo.
Pois se algum homem o tiver, estará excluindo Poder do soberano. Logo, deixaria de existir soberania.
O soberano não pode estar sujeito às leis que estabeleceu, pois “ninguém pode submeter-se a si mesmo...”. Isto ocorre porque ele somente ele, e mais ninguém, tem o poder de promulgar, revogar, ab-rogar leis,etc. Todo poder legislativo (o Estado) é legibus solutus, ou independente das leis.
Chegamos então aos deveres do soberano (que não são obrigações, pois somente a lei obriga, e ele não está submetido a elas). Não são as coisas que ele pode fazer, já que ele pode tudo; e sim, o que ele deve fazer, o seu compromisso com o povo.
Dentre as obrigações do Estado estão:
· a segurança (salus populi) : a segurança do povo não está somente em garantir-lhes a conservação da vida contra todos os perigos, mas também o gozo das legítimas satisfações da vida (ter um lar, saúde, educação, etc.).
· a liberdade : é “A ausência de impedimento exterior a nossos desejos”. O súdito tem direito de praticar todos os atos que a lei não proíbe, e só eles. Assim, as leis não tiram a liberdade, pois servem para direcionar as ações para que reine a paz.
· a igualdade perante a lei e os cargos públicos, a instrução e a educação : que ele forneça trabalho a todos (ao invés de deixar os incapazes de trabalhar na dependência de caridades).
E então, o Leviatã, o monstro com coração de pedra, se torna humano...
Dentre os deveres do soberano, encontra-se também o de ser constantemente afortunado, sucessful. Porque se um soberano não tem condições de manter seu povo protegido de guerras e civis e estrangeiras, estes podem desfazer o seu “contrato” com o mesmo e buscar o lado vendedor, para que faça a sua proteção.
Espitritismo à M. Oakeshott, um comentador de Hobbes, demonstrou que existiam apenas dois caminhos ao espiritismo da época:
· o primeiro, era o da religião natural, onde os homens eram guiados a seguir o deísmo e até o puro racionalismo;
· o segundo, era o de uma religião civil, onde os homens teriam como seus “deuses” seus governantes.
Se existirem leis religiosas e leis civis, ambas não podem se contradizer, até mesmo para a manutenção da paz. No caso, a explicação sobre a questão do povo acreditar em seu súdito como um deus, não é uma crença, mas sim uma obediência existente para com o soberano. E que não haja discussões político-religiosas, pois isto é fatal para a paz. “A paz que exige, em matéria de atos exteriores da religião, não a tolerância, mas o conformismo. Isso é tudo.”
Como se sabe, a Monarquia era a forma de governo preferida por Thomas Hobbes. Ele explica que é por conta dos gastos excessivos que a Democracia tinha em relação à Monarquia.
O outro motivo ele deixa bem claro: há uma tendência natural de todo governante dar vantagens a seus amigos e familiares. E se existir uma forma de governo que permita deter o poder em mãos e também poder ter essas vantagens aos queridos, é o melhor regime. Como a monarquia o permite, logo ela é o melhor governo.
O corpo do Estado é descrito por Hobbes como sendo um corpo humano, pois, segundo ele, são vários homens formando um só, que comandará todo o povo.
Os órgãos que compõem o corpo do Homem Artificial são:
· Alma: soberania
· Músculos: assembléias legítimas
· Tumores: assembléias ilegítimas
· Nervos e Tendões: ministros públicos
· Órgãos da fala: pessoas públicas
· Mãos e Olhos: ministros do Estado
· Ouvidos: ministros públicos
· Corrente sanguínea: acondicionamento
· Veias do coração: receitas e despesas
· Filhos do Estado: colônias
· Juntas: magistrados e outros funcionários judiciais ou executivos
· Nervos: recompensas e castigos
· Força: riqueza e prosperidade de todos os membros artificiais
· Objetivo: segurança do povo
· Memória: conselheiros
· Vontade: Leis
· Razão: justiça
· Saúde: concórdia
· Doença: sedição
· Morte: guerra civil
Os autores que foram influenciados por Thomas Hobbes são:
· John Locke
· Baruch de Spinoza
· Charles Montesquieu
· Jean Jacques Rousseau
· Émile Durkheim
· Friedrich Nietzsche
Ao analisar todo o estudo feito a respeito de Hobbes e sua obra, pude constatar a sua importância para todo estudante de Direito. A contemporaneidade das suas ideias é fascinante, e ajuda (e muito) na compreensão da evolução do próprio Direito.
Em suma, Thomas Hobbes sempre foi um grande estudioso dos problemas sociais. Defendia a todo momento a monarquia, a forma de governo absolutista. Defendia a soberania como sendo uma, pois a sua divisão causaria enfraquecimento da mesma. Estabelece os tipos de contratos (contrato corporativo e contrato individualista) e as formas de apresentação de um Estado (monarquia, democracia e aristocracia). Com seus estudos, Hobbes consegue ainda dizer quais são as obrigações de um Estado (segurança, igualdade e liberdade), e como deverão ser exercidas.
Dentro de sua explicação da “forma” do Estado, Thomas toma como referência o corpo humano, formado por vários órgãos para que funcione perfeitamente bem. Ou seja, o corpo humano é o Estado, que é composto por várias pessoas para que haja uma harmonia no funcionamento deste.
Por todas as suas ideias geniais, Hobbes veio a influenciar vários dos escritores que viriam após ele, e tornou seu livro “O Leviatã” uma ‘bíblia’ do Direito, para os ingleses.
Sendo assim, posso concluir que o estudo de Hobbes me acrescentou muito, e com certeza a compreender melhor a evolução do Direito até os dias atuais.
HOBBES, Thomas. O Leviathan. Tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva