segunda-feira, 26 de março de 2012

Excludentes de Ilicitude (completo, com jurisprudências sobre)

Introdução

Nos processos penais, é sempre certo que seja alegado pelo agente a exclusão da ilicitude do fato, ou até mesmo da sua culpabilidade.
É sabendo disto que será feito esse estudo acerca da extinção da ilicitude do fato, acompanhado pelo Código Penal, e seus artigos 23 a 25, que tratam da matéria.
Excluir a ilicitude de um fato não significa excluí-lo ou apagá-lo, até porque não seria possível, quanto menos ignorá-lo. Significa simplesmente que ele deixará de ser ilícito, e será então aceito.
Com base no breve conceito supra é que será desenvolvido o presente trabalho, não esquecendo de sempre exemplificar, e apresentar as respostas às questões propostas na sala de aula para resolução.
Boa leitura!

Causas Excludentes de Ilicitude

Conceito Básico


São chamadas de causas excludentes de ilicitude aquelas que “excluem o crime”, ou seja, quando ocorre uma contrariedade entre o que determina o ordenamento jurídico e o fato, em razão de a sociedade aceitar esse tipo de conduta.
Para que possamos compreender melhor os conceitos aqui passados, temos, primordialmente, que ler o artigo 23 do CP, o qual elenca os tipos de causas excludentes, que serão estudadas uma a uma a seguir:
Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: 
I - em estado de necessidade;
 II - em legítima defesa;
 III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Podemos resumir o conceito de excludentes dizendo que é o que ocorre quando, ao praticar um ato típico considerado antijurídico, tal antijuridicidade é excluída em virtude de enquadrar-se nos casos descritos no art. 23 e subsequentes, pelo simples motivo de o ordenamento aceitar tais práticas, sendo consideradas, então, legais.
Descritos nos artigos 23, 24 e 25 do Código Penal, sendo que no artigo 23 encontram-se descritas de forma genérica quais são as causas excludentes, e o exercício regular do direito e estrito cumprimento do dever legal. Já o artigo 24 traz detalhadamente como se dá o chamado estado de necessidade, enquanto o artigo 25 traz a legítima defesa. Veremos a seguir mais sobre cada tipo.

Excesso punível 
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
Não se pode esquecer, ainda, do parágrafo único do artigo, tendo em vista que ele condena toda e qualquer prática que possa ser considerada abusiva.
Assim sendo, se o agente que praticar o fato típico não tiver certa moderação na hora de praticá-lo ou de escolher os meios para tanto, ele estará agindo em excesso, e não será aceita a alegação de excludente de antijuridicidade.

Estado de necessidade

Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
§ 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.
 § 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.
Segundo o artigo supra, o Estado de necessidade ocorre quando o agente comete um fato típico para salvaguardar de perigo atual e inevitável o perigo juridicamente protegido.
Tal fato pode ser cometido para proteger direito seu ou de terceiro, e que a respeito do bem sacrificado, não era razoável exigir-lhe conduta adversa da que teve.
Para que seja efetivamente caracterizado o Estado de Necessidade, é necessário que haja perigo, e que este não tenha sido provocado voluntariamente pelo agente. Ainda há que se falar em perigo atual, e não iminente.
O Princípio da Proporcionalidade na aplicação do estado de necessidade existe na questão de que não pode o agente agir contra um bem maior para salvaguardar outro menor – ex: para salvar sua mala, ele joga a outra pessoa de dentro do barco. Além, é claro, de estar agindo em plena consciência, como exigido na Legítima Defesa.
Segundo o parágrafo 1º do artigo em questão, o estado de necessidade não pode ser alegado por quem tenha a obrigação de enfrentar o perigo.
Numa breve diferenciação, podemos afirmar que esta excludente caracteriza-se por uma AÇÃO.
Jurisprudência:
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
15a Câmara de Direito Criminal
Apelação n° 990.10.105855-3
Comarca: São Bernardo do Campo
Apelantes: Jefferson Ferreira dos Santos
Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo
Voto n° 2167
APELAÇÃO - FURTO - CONFISSÃO - ESTADO DE NECESSIDADE OU FURTO FAMÉLICO - HIPÓTESE QUE NÃO SE ENQUADRA NA DEFINIÇÃO DO ART. 24, DO CÓDIGO PENAL - USUÁRIO DE DROGAS QUE VENDEU MERCADORIAS FURTADAS PARA ANGARIAR RECURSOS ALMEJANDO O SUSTENTO DO VÍCIO - RECURSO IMPROVIDO. Não se constata o
estado de necessidade o ocorrência de furto famélico, uma vez que o acusado é usuário de drogas e se evidencia que utilizou o lucro obtido com a venda das
mercadorias para a aquisição de substâncias entorpecentes.
Vistos.
Pela r. sentença de fls. 125/131, o réu Jefferson Ferreira dos Santos foi condenado como incurso no art. 155, incisos I, do Código Penal, ao cumprimento da pena de l(um) ano, substituída por prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixada em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente à época do fato. Foi fixada a quantia de R$ 500,00 (quinhentos reais), referente
à reparação de danos causados à vítima. Apela o réu (fls. 137/140), sustentando que é dependente químico, agindo sem plena consciência, prova disso é a sua internação em instituição de reabilitação de drogas; dever ser reconhecido o crime como furto famélico. Contrariado o recurso (fls. 142/144), subiram os autos, tendo o douto Procurador de Justiça opinado pelo não provimento do apelo (fls. 152/154).
É o relatório.
O apelo não comporta provimento.
O réu foi condenado porque, segundo a denúncia, no dia 30 de janeiro de 2008, por volta das 07 horas, mediante rompimento de obstáculo, subtraiu 12 panelas, diversas garrafas de refrigerante e algumas
garrafas de bebida alcoólica.
A materialidade delitiva foi devidamente demonstrada por meio do boletim de ocorrência (fls. 03/04). A autoria também é certa, haja vista que o réu admitiu a prática do furto (fls. 109/110). Segundo o réu, morava na rua, embaixo de uma ponte, e passava por necessidades, adentrou no imóvel da vítima, mediante arrombamento e subtraindo as panelas e
bebidas. Acrescentou que vendeu as panelas e algumas bebidas, e algumas delas utilizou para consumo (fls. 109).
Segundo a vítima, o imóvel invadido era utilizado por ele para o preparo de refeições e venda de bebidas. Chegando ao local, no dia dos fatos, verificou o arrombamento da porta dos fundos do estabelecimento;
constatou, ainda, a subtração de várias panelas, alimentos e bebidas (fls. 82).
A testemunha Zenildo Trindade da Silva declarou que presenciou o momento em que o réu se retirava do interior do estabelecimento, portando um saco, pulando a cerca. Aduziu, ainda, que chegou a argumentar com Jefferson para desistir da prática delitiva, porém,
respondeu-lhe que seu "negócio era dinheiro" (fls. 84/85).
Assim, diante de tais provas a condenação se impunha.
A tese de que o acusado cometeu o delito por estado de necessidade e ser o furto famélico, não prospera, tendo em vista que o art. 24, do Código Penal, dispõe que:
"considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato
para salvar de perigo atual, que não provocou por sua
vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou
alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável
exigir-se".
E é evidente que o furto não foi por estado de necessidade, uma vez que entre os bens surrupiados haviam bebidas alcoólicas e panelas, que não são aptos a saciar a fome; demonstrando claramente seu objetivo, que era o de angariar fundos para sustentar o vício das drogas. Nesse sentido:
"O estado de necessidade não justifica, por si, a
incursão do agente pelo patrimônio alheio, até porque não é
através do saqueamento, sem repreensão, aos cabedais de
terceiras pessoas, que se constituirá uma sociedade mais
justa, com uma melhor distribuição das riquezas desiguais." (PJD 241/167).
A simples alegação de ser pobre, usuário de drogas e estar desempregado não assegura ao apelante o direito de cometer o crime e nem tira o caráter punível do ato praticado.
Logo, como se vê, o liquet foi bem lançado e a pena corretamente estabelecida, não merecendo reparo a r. sentença da lavra da ilustre juíza Sandra Regina Nostre Marques.
Apelação Com Revisão n° 990.10.105855-3- São Bernardo do Campo- Voto n"2167v

Legítima defesa

Retirando a ilicitude do ato praticado pelo agente, a legítima defesa é o instituto que usa ‘justificar’ a conduta praticada para repelir injusta agressão.
Também chamado de ‘direito de defesa’, ocorre quando um agente é agredido – algum bem, não necessariamente a vida –, e acaba por agredir de volta o agressor inicial, com o intuito de não ser lesado em seu direito.
Para que seja aceita a teoria, há de se haver agressão, que deverá ser injusta, que seja atual ou iminente (prestes a acontecer), e os meios de defesa deverão ser empregados de forma moderada, proporcional. Além disso, deve o agente (que vai se defender) ter consciência de que está defendendo a si ou direito alheio.
Encontra-se descrita no art. 25 do Código Penal:
Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Trata-se, portanto, de uma REAÇÃO a lesão.
Jurisprudência:
RECURSO ESPECIAL Nº 917.034 - PE (2007/0005766-8)
RELATOR
:
MINISTRO JORGE MUSSI
RECORRENTE
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO
RECORRIDO
:
SAMPSON ARAÚJO ALVES (PRESO)
ADVOGADO
:
LAÉRCIO RIBEIRO DE SOUZA NETO E OUTRO
EMENTA
HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JÚRI. LEGÍTIMA DEFESA. ALEGAÇAO. INJUSTA AGRESSAO.AFASTAMENTO. EXCESSO CULPOSO/DOLOSO. QUESITAÇAO PREJUDICADA.
1. Afastada pelos jurados a indagação de que o acusado repeliu injusta agressão, elemento essencial da legítima defesa, a quesitação acerca do excesso culposo/doloso fica prejudicada.
2. Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDAO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.
Brasília (DF), 17 de junho de 2010. (Data do Julgamento).
MINISTRO JORGE MUSSI
Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 917.034 - PE (2007/0005766-8)
RECORRENTE
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO
RECORRIDO
:
SAMPSON ARAÚJO ALVES (PRESO)
ADVOGADO
:
LAÉRCIO RIBEIRO DE SOUZA NETO E OUTRO
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público, com suporte no art. 105, inciso III, alíneas a , da Constituição Federal, contra acórdão da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco que, à unanimidade, acolheu preliminar suscitada pela Defesa - erro na quesitação - e, em consequência, anulou o julgamento realizado pelo Tribunal do Júri da Comarca de Olinda, restando o aresto assim ementado (fl. 250):
"PROCESSUAL PENAL. APELAÇAO CRIME. HOMICÍDO DUPLAMENTE QUALIFICADO. ART. 121, 2º, INCISOS II E IV DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARMENTE, ALEGA QUE A JUÍZA A QUO INCORREU EM ERRO AO NAO ABSOLVER O ORA APELANTE, UMA VEZ QUE OS JURADOS ACATARAM, POR MAIORIA, A TESE DA LEGÍTIMA DEFESA SUSTENTADO EM PLENÁRIO. NO MÉRITO, REQUER A SUBMISSAO A NOVO JULGAMENTO POPULAR, POR TER O CONSELHO DE SENTENÇA FORMADO SUA CONVICÇAO EM DESACORDO AO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS. Preliminar acolhida não nos moldes postos pela defesa do apelante, mas sim no sentido de que seja o ora acusado submetido a novo julgamento pelo Tribunal do Júri da Comarca de Olinda-PE, devido ao transtorno ocorrido no ponto referente aos quesitos postos à discussão em plenário. Decisão unânime."
Consta dos autos que Sampson Araújo Alves, ora recorrido, foi denunciado por homicídio qualificado (motivo fútil e recurso que impossibilitou a defesa da defesa). Prolatada sentença de pronúncia nos termos da exordialacusatória, foi o réu, em 24/08/2004, levado ao Tribunal do Júri da Comarca de Olinda e lá condenado à pena de 15 (quinze) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente no modo fechado.
O Tribunal de Justiça pernambucano, ao julgar recurso de apelação interposto pela defesa, à unanimidade, acolheu preliminar de mérito a fim de, reconhecendo erro/equívoco na quesitação, anular o julgamento realizado pelo júri, determinando-se que o acusado seja submetida a novo julgamento Popular.
No Especial (fls. 265/280), busca o Parquet demonstrar que o aresto objurgado contrariou os arts. 484, III, e489, ambos do Código de Processo Penal, bem como o art. 25 do Código Penal. De início, afirma que toda a matéria encontra-se prequestionada na origem. No mérito, sustenta o recorrente que o júri deve responder positivamente não só a questão da ocorrência da legítima defesa, tese levantado em plenário, como também cabe ao magistrado indagar acerca de todos os requisitos elencados no art. 25 do Código Penal, a saber: injusta agressão, atual ou iminente, uso moderado dos meios necessários. Assevera que, uma vez pronunciada resposta negativa a qualquer do elementos lá indicado, os demais quesitos ficarão prejudicados, repelindo-se, por completo, o reconhecimento da excludente de ilicitude.
Aduz com inteligência que a quesitação acerca do excesso na legítima defesa (doloso ou culpa) só ocorrerá na hipótese de já reconhecida a legítima de defesa, o que no caso não ocorreu.
Requer, ao fim e ao cabo, o conhecimento e o provimento do recurso especial para que seja reformado o acórdão recorrido, podendo, assim, o Tribunal de origem prosseguir no julgamento do recurso de apelação.
Contra-arrazoado o inconformismo (fls. 286 288), o recorrido, em preliminar, pugnou, singelamente, pelo não conhecimento da irresignação em virtude da ausência de prequestionamento e, no mérito, pela manutenção doacórdão recorrido.
Admissibilidade positiva na origem (fls. 291/292), os autos foram remetidos a este Sodalício, manifestando-se a douta Subprocuradoria-Geral da República pelo improvimento do recurso. Eis a ementa do parecer (fls. 308/309):
"RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JÚRI. LEGÍTIMA DEFESA. QUESITAÇAO OBRIGATÓRIA. NULIDADE ABSOLUTA.
Efetivamente, não poderia a Juíza Presidente do Tribunal do Júri, mesmo diante da negativa ao quesito relativo à injustiça da agressão, ter considerado prejudicados os demais, inclusive os concernentes ao excesso doloso ou culposo, ou de legítima defesa putativa, vez que só assim seria possível auferir, de forma inequívoca, a vontade dos jurados a respeito do conhecimento da legítima defesa do paciente na prática do fato. Precedentes.
Um vez reconhecida a obrigatoriedade da quesitação quanto aos desdobramentos da legítima defesa, sua ausência, a teor do disposto no verber sumular nº 156 do Súmula do Supremo Tribunal Federal, constitui nulidade absoluta.
Parecer pelo conhecimento e improvimento do recurso."
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 917.034 - PE (2007/0005766-8)
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Primeiramente, rechaça-se o pleito de não conhecimento do especial por ausência de prequestionamento, já que a Corte Estadual examinou devidamente a matériaobjeto do recurso, a ver pelo seguintes trechos do acórdão recorrido (fls. 251 a 253):
"[...]
Realmente, percebe-se que houve um equívoco por parte da Magistrada que presidiu o Júri em comento, uma vez que, embora os Jurados tenham respondido, por maioria, que o ora acusado agiu amparado pela legítima defesa, tais jurados também entenderam que o apelante em tela não se defendeu de uma agressão injusta.Todavia, a retromencionada Magistrada considerou prejudicados parte dos quesitos subsequentes, inclusive os que se referiam ao excesso doloso ou culposo, somente voltando a indagar os Jurados em questão quando dos quesitos referentes às qualificadoras às circunstâncias atenuantes do delito em epígrafe.
[...]
Contudo, o fato de os Jurados terem considerado que a agressão não foi injusta, não possui o condão de desconfigurar a caracterização da legítima defesa, pois a agressão precisa ser constituída de qualquer comportamento humano que lese ou coloque em risco um direito, e a injustiça é apenas uma das formas deapresentação da agressão. Inclusive, este entendimento esta em consonância com a jurisprudência pátria.
[...]
Sendo assim, o equívoco da Douta Magistrada a quo restringiu-se ao fato de ter considerado prejudicados os demais quesitos, indo de encontro, inclusive, ao disposto no art. 484, III, do CPP, o qual obriga que sejam formulados os quesitos referentes ao excesso doloso ou culposo, quando reconhecida qualquer excludente de ilicitude...
[...]
É justamente neste ponto que se encontra a contradição, a qual deveria ter sido solucionada pela Douta Juíza a quo, pois não foi possível aferir qual a intenção clara e inequívoca dos Jurados, tendo a Juíza ido de encontro, inclusive, ao disposto no art. 489 do CPP, o qual dispõe, de forma clara, que: "se a resposta a qualquer dosquesitos estiver em contradição com outra ou outras já proferidas, o juiz, explicando aos jurados em que consiste a contradição, submeterá novamente à votação os quesitos a que se referem tais respostas".
Resta claro, no nosso entendimento, que não se trata, como quer a Defesa, de conceder a absolvição do acusado em tela, mas sim de anulação do julgamento ocorrido, a fim de que seja o ora acusado submetido a novo julgamento pelo Tribunal do Júri da Comarca de Olinda-PE, tudo isto devido ao transtorno ocorrido no ponto referente aos quesitos postos em discussão."
Por tal razão, rejeita-se a preliminar arguida pela Defesa. Passa-se à análise do mérito.
Observa-se que os dois dispositivos do Código de Processo Penal, citados no recurso especial como contrariados pelo acórdão impugnado (arts. 484, III, e 489), sofreram alteração com o advento da Lei nº11.689/2008. Depreende-se, portanto, que o julgamento do recurso de apelação e a interposição do especialocorreu em momento anterior à entrada em vigor da aludida lei. É cediço que no âmbito do direito processual penal, quando se fala em aplicação da lei no tempo, vige o princípio do efeito imediato, representado pelo brocardo latino tempus regit actum , conforme previsão contida no artigo  do Código de Processo Penal.Portanto, a análise aqui feita será dos dispositivos vigentes à época do julgamento. A propósito, ei-los:
"Art. 484, III:"se o réu apresentar, em sua defesa, ou alegar, nos debates, qualquer fato ou circunstância que por lei, que isente de pena ou exclua o crime, ou o desclassifique, o juiz formulará os quesitos correspondentes, imediatamente depois dos relativos ao fato principal, inclusive aos relativos ao excesso doloso ou culposo, quando reconhecida qualquer excludente de ilicitude."
"Art. 489:"se a resposta a qualquer dos quesitos estiver em contradição com outras já proferidas, o juiz, explicando aos jurados em que consiste a contradição, submeterá novamente à votação os quesitos a que se referirem tais respostas."
É cediço que, após a quesitação do fato principal, deve suceder as teses defensivas. Consta dos autos que a legítima defesa foi alegada em plenário, daí que, confirmada pelos jurados a materialidade e a autoria do fato (1º e 2º quesitos), passou-se a indagar a ocorrência da excludente de ilicitude.
No terceiro quesito, responderam os jurados, por maioria, que o acusado praticou o fato em defesa de sua própria pessoa. Na pergunta seguinte (4º quesito), também por maioria, os jurados afastaram a tese de que o réu defendeu-se de uma injusta agressão. Daí o entendimento da Juíza Presidente no sentido de que os demais quesitos acerca da legítima defesa estariam prejudicados.
A pergunta que agora se faz é a seguinte: deveria a Juíza Presidente prosseguir nos demais quesitos, mormente aqueles que indagariam acerca do excesso doloso ou culposo?
O Tribunal de Justiça de Pernambuco decidiu que sim, reconhecendo, portanto, a nulidade do julgamento popular.
No entanto, tenho eu outro entendimento.
Para a caracterização da legítima defesa, há a necessidade dos jurados responderem afirmativamente a cinco requisitos: (I) o acusado praticou o fato em defesa própria ou de terceiro, (II) a agressão repelida era injusta, (III) a agressão era atual e eminente, (IV) os meios utilizados pelo agente para repelir a agressão foram os necessários e (V) os meios foram usados moderadamente. Ora, uma vez pronunciada resposta negativa a qualquer uma das três primeiras indagações, o Juiz Presidente do tribunal do júri julgará prejudicados os demaisquesitos. A indagação acerca do excesso (doloso ou culposo), só ocorrerá quando negada a necessidade do meio empregado e o uso moderado dos meios para repelir injusta agressão.
Neste sentido as lições de Hermínio Porto:
"Negado o quesito sobre a necessidade (o que significa entendimento de ter o acusado adotado ou escolhido meios de repulsa desnecessários para impedir ou fazer cessar a agressão, atual ou iminente e injusta, que sofria) e negado o quesito sobre a moderação (o que significa entendimento de ter o acusado empregado, ou usado, de maneira imoderada o meio defensivo escolhido), resulta entendimento sobre a presença de um excesso de reação; para o conhecimento da natureza de tal excesso, se culposo ou se doloso, prossegue a votação do questionário na seriação referente à legítima defesa para indagação do excesso culposo, e, se negado o quesito (...), optaram os jurados pelo excesso doloso, ficando inteiramente afastada a tese defensiva." (Júri, HERMÍNIO ALBERTO MARQUES PORTO, 12ª ed., págs. 242/243)
Outro também não é o entendimento de Alberto Silva Franco, Rui Atoco e Adriano Marrey:
"Afirmado o 4º quesito, vota-se o quesito sobre a injustiça da agressão. Negado o 4º quesito, fica rejeitada a excludente da legítima defesa.
Afirmado o 5º quesito (agressão injusta), passa-se à votação do 6º, que se refere à "necessidade dos meiosempregados". Se negado o 5º quesito, fica também afastada a excludente de ilicitude. " (Teoria e Prática do Júri, 7ª ed., ALBERTO SILVA FRANCO, RUI STOCO E ADRIANO MARREY, pág. 563
Tais as circunstâncias, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento a fim de anular o acórdão recorrido e, em consequência, determinar que o Tribunal a quo prossiga, como entender de direito, no julgamento da apelação interposta pela Defesa.
CERTIDAO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA

Estrito cumprimento do dever legal

Fernando Capez bem conceitua o estrito cumprimento do dever legal, ao afirmar que nada mais é senão o agente cumprindo determinada obrigação que lhe é imposta por lei, sendo que pratica ato dentro dos limites dessa obrigação.
Isso significa que se houver excesso, assim como nos demais casos de excludentes, não será acatado o pleito de estrito cumprimento do dever legal.
Neste caso, portanto, a pessoa está cumprindo uma obrigação que lhe é imposta por lei, mas que esta acaba por caracterizar um fato típico, mas não antijurídico.
Encontra-se definido no art. 23 do CP, em seu inciso III:
Art. 23. “Não há crime quando o agente pratica o fato:
(...)
III – em estrito cumprimento de dever legal...”
Para uma breve conclusão, pode-se afirmar que a palavra-chave desta excludente é OBRIGAÇÃO.
Jurisprudência:
HABEAS CORPUS Nº 128.103 - BA (2009/0023100-8)
RELATOR
:
MINISTRO OG FERNANDES
IMPETRANTE
:
VALTER LEAL MARTINS
ADVOGADO
:
PAULO DE SOUZA FLÔR JÚNIOR
IMPETRADO
:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
PACIENTE
:
VALTER LEAL MARTINS
EMENTA
HABEAS CORPUS . ROUBO CIRCUNSTANCIADO. SENTENÇA CONDENATÓRIA CONFIRMADA EM SEDE DE APELAÇAO. POLICIAL MILITAR. ALEGAÇAO DO PACIENTE TER AGIDO EM ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. REEXAME DE CONJUNTO FÁTICO E PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. VIOLAÇAO DA AMPLA DEFESA. NAO OCORRÊNCIA. COMPARECIMENTO DE DEFENSOR AS AUDIÊNCIAS DE OITIVA DE TESTEMUNHAS.
1. A jurisprudência desta Corte é uníssona no sentido de que o trancamento de ação penal pela via estreita dohabeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca e sem a necessidade de incursão probatória, a existência de excludente de ilicitude, circunstância não constatada na hipótese.
2. No caso, não há como infirmar, sem rever todo o contexto das provas, a incidência da excludente de ter agido o réu no estrito cumprimento do dever legal e, assim, afastar a condenação pelo crime de roubo.
5. É improcedente a alegação de violação à ampla defesa quando o paciente, preso, é requisitado para a audiência de oitiva de testemunhas, além de se encontrar devidamente acompanhado de defensor. Tese,ademais, não arguida na instância inferior.
6. Ordem parcialmente conhecida e, nessa extensão, denegada..
ACÓRDAO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente da ordem de habeas corpus e, nessa parte, denegá-la, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Celso Limongi(Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Brasília (DF), 16 de setembro de 2010 (data do julgamento).
MINISTRO OG FERNANDES
Relator
HABEAS CORPUS Nº 128.103 - BA (2009/0023100-8)
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO OG FERNANDES: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Valter Leal Martins condenado, por roubo duplamente circunstanciado, à pena de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, além de 13 (treze) dias-multa contra acórdão proferido pela Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, que deu parcial provimento ao recurso de apelação interposto pelo paciente, nos termos da seguinte ementa (fl. 79):
APELAÇAO CRIME - ROUBO - DUPLAMENTE QUALIFICADO - CRIME PRATICADO POR POLICIAIS MILITARES - APREENSAO DA ARMA - MOMENTO DA CONSUMAÇAO - PALAVRA DA VÍTIMA - ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL OU EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO - INOCORRÊNCIA. I - Assim como as demais excludentes de ilicitude, o exercício regular de direito ou estrito cumprimento do dever legal exige que o agente tenha consciência de que age sob essa causa de justificação. Em face das circunstânciasfáticas evidenciadas, bem como o conjunto probatório dos autos, afasta-se a aplicação da pretendida excludente. II - A remoção e retirada do bem da esfera de vigilância da vítima, ainda que momentaneamente,em consonância com a vertente doutrinária denominada amotio, - STF (RTJ 135/161), acarreta a plena consumação do delito, sendo irrelevante a apreensão ou entrega posterior da coisa subtraída. III - Nos crimescontra o patrimônio a palavra da vítima assume importante valor, ainda mais quando corroborada com outros elementos fáticos-probatórios. IV - Inquéritos ou ações penais em andamento não se prestam para configurar maus antecedentes no momento da fixação da pena-base, em respeito ao princípio da não-culpabilidade. Redução da pena.
Alega o impetrante, em síntese: I) a inexistência do cometimento do crime de roubo; II) a incidência da excludente de ilicitude prevista no art. 23, III, do Código Penal (estrito cumprimento de dever legal); III) a violação à ampla defesa, na medida em que "a defesa foi desconsiderada em todas as fases do processo" (fl. 34), nãotendo o paciente participado "de qualquer audiência, inclusive a de oitiva de testemunhas de acusação" (fl. 35); e IV) perseguição e vingança do magistrado local. Requer, ao fim e ao cabo, seja determinado o trancamento da ação penal, em sua totalidade.
Indeferida a liminar e solicitadas as informações, foram os autos ao Ministério Público Federal que, em parecer da lavra do Subprocurador-Geral Wagner de Castro Mathias Netto, manifestou-se pela denegação da ordem.
É o relatório.
HABEAS CORPUS Nº 128.103 - BA (2009/0023100-8)
VOTO
O SR. MINISTRO OG FERNANDES (RELATOR): De início, antes da análise das alegações do impetrante, cumpre-me ressaltar que o presente caso foi objeto de recurso especial que, inadmitido na origem, ensejou a interposição de agravo de instrumento (Ag nº 1.205.975/BA, de minha Relatoria) que foi julgado em 17.6.10 ,oportunidade em que se lhe negou provimento. Tal decisão foi agravada, vindo-me conclusos em os autos em7.7.2010 . Ou seja, não houve o trânsito em julgado.
As duas primeiras alegações inexistência do crime de roubo e a incidência de excludente de ilicitude estão ligadas. Assim, não poderia haver roubo se o paciente estivesse no estrito cumprimento do dever legal e é, nesse sentido, que se direcionam os argumentos do impetrante.
Para melhor compreensão dos fatos, extrai-se da sentença, no que interessa, o seguinte (fls. 566/567):
Efetivamente, a prova dos autos mostra que no dia dos fatos narrados na denúncia, os acusados não estavam fardados e não estavam em diligência policial e, por outro lado, o fato delituoso foi praticado no Município de Glória, local diverso do Município de Paulo Afonso, onde os acusados eram lotados na época. Agiram eles, portanto, de forma clandestina, invadindo residência alheia, por conta própria, não caracterizando a ação deles como ato de autoridade e, portanto, não houve o delito de abuso de autoridade,entendimento esse, aliás, que é sufragado pela jurisprudência de nossos tribunais:
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De referência ao delito de ameaça, este restou provado nos autos, pois, conforme relatado das testemunhas, o acusado Valter Leal Martins ameaçou as vítimas, intimidando-as, objetivando que elasnão prestassem depoimentos contra Gerôncio Campos Fonseca, denunciado juntamente com o mesmo Valter Leal Martins no processo crime nº 07/95, onde eles foram pronunciados por homicídio duplamente qualificado, praticado contra as vítimas José Manoel da Conceição e Eliseu Barbosa Fortes Filho .
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Quanto ao delito de roubo, por sua vez, o mesmo resultou provado nos autos, pois os acusados fazendo o uso de arma de fogo e emprego de ameaça contra as vítimas, com o concurso de outras pessoas, retirou da posse da vítima Luiz Carlos da Silva a arma de fogo deste, no interior de sua residência.
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Por seu turno, a versão da defesa de que a arma subtraída da vítima foi entregue ao Adjunto de Delegado Regional em Paulo Afonso, não encontra apoio na prova dos autos. Primeiramente, caso o acusado tivesse a intenção de entregar a arma subtraída da vítima à autoridade policial, deveria ter levado para o Delegado de Polícia do Município de Glória, local de residência da vítima, e não para a Delegacia de Polícia de Paulo Afonso. Segundo, os autos do inquérito policial que instruiu este processo foi requisitado ao Delegado Especial designado para Paulo Afonso, em decorrência de desmandos na Polícia Civil daquele Município, em 08.05.95 e, em 09.05.95 (fls. 05v), o então Delegado Especial, Dr. Manoel Amado Bahia, determinou que o DelegadoCircunscricional de Paulo Afonso atendesse a requisição do Dr. Promotor Público, visando a instauração do inquérito policial pelos fatos noticiados na denúncia. Depois de concluído o referido inquérito policial, quando já tinha sido oferecida a denúncia contra os acusados, o Delegado Circunscricional de Paulo Afonso, em 04.07.95, pelo ofício de fls. 27, encaminhou a este Juízo a arma subtraída da vítima, com o termo de apreensão de fls. 28, datado de 02.05.95, cujo termo foi fabricado pela autoridade policial que presidiu o inquérito, depois que os acusados foram denunciados, na tentativa de criar um embuste. Se assim não fosse, a autoridade policial que presidiu o inquérito policial e o remeteu a este juízo em 24.05.95, teria anexado o inventado termo de apreensão da arma.
Do acórdão, que manteve a condenação, merecem destaque os seguintes excertos (fls. 80/81):
Os depoimentos testemunhais são uníssonos e coerentes, coadunando parcialmente com os interrogatórios dos réus que tentam eximir-se da ilicitude da conduta, demonstrando, com riqueza de detalhes como se deu a invasão e a ameaça sofrida por todos que ali se encontravam (...). De igual modo, a oitiva das testemunhas da defesa não muito ajudou na compreensão da causa. Três não presenciaram os fatos (...), estas teriam apenas confirmado a entrega da arma na delegacia. As outras não se lembram muito do fato, existindo em sua declarações pequenas contradições, tendo inclusive, uma das testemunhas afirmado que logo em seguida teria saído da cena do crime.
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Do exame do conjunto probatório, de per si, exclui-se a tese suscitada pela defesa concernente à prática da conduta no exercício da função de policial na apreensão de uma arma de fogo de quem a detinha de formailícita.
O exercício regular de direito contemplado no nosso Código Penal como causa excludente da antijuridicidade ou da ilicitude provém regularmente de uma atividade permitida e regulada pelo Estado,mesmo que se apresente algum risco para quem a exerça ou dela necessite.
Assim, como as demais excludentes de ilicitude, o exercício regular de direito ou estrito cumprimento do dever legal exige que o agente tenha consciência de que age sob essa causa de justificação, ou seja, é preciso que o agente que praticou a conduta típica tenha atuado querendo praticá-la, mas com consciência de que cumpria um dever imposto pela lei.
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I ndaga-se que o agente, lotado na Companhia de Paulo Afonso, agiu na cidade de Glória. Não portava mandado judicial e nem estava em diligência policial. Na hipótese de ter apreendido a arma, por não ter a vítima porte legal, aconteceria, naquela ocasião uma prisão em flagrante. Não obstante, não houve qualquer prisão em flagrante delito, nem ao menos encaminhamento de qualquer envolvido no alegado "tiro ao alvo" à delegacia local. Ainda como bem frisado pelo magistrado sentenciante, uma vez apreendida a arma de fogo, deveria ser levada e entregue à autoridade competente da cidade de Glória onde reside a vítima e aconteceu o fato, e não para a cidade de Paulo Afonso.
Ademais, afasta-se a justificativa de não ter a arma apreendida sido entregue, logo em seguida, por se encontrar em final de semana, quando o mister de policial obriga a entrega imediata de qualquer bemapreendido. Noutro lado, cediço que nas delegacias existem plantões, e se caso não imaginasse existir naquele momento escrivão para lavratura do auto de apreensão - como alegou no interrogatório - haveria, no mínimo, alguém responsável para lavrar qualquer termo de entrega do bem apreendido, por ser porte ilegal e se tratar de arma de fogo.
Como se vê, na sentença e, também, no acórdão, todo o imbróglio girou em torno da alegação de estrito cumprimento do dever legal e, após o amplo exame dos fatos e das provas, a conclusão das instâncias ordinárias pela configuração do crime de roubo.
Diante desse quadro fático que foi delineado e que não há como ser modificado ou contradito pela via eleita não vejo como infirmar, sem rever todo o contexto das provas, se efetivamente seria o caso de incidir a sobredita excludente e, também, afastar a condenação pelo crime de roubo.
A jurisprudência desta Corte é uníssona no sentido de que o trancamento de ação penal pela via estreita dohabeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca e sem a necessidade de incursão probatória , a existência de excludente de ilicitude, circunstância nãoconstatada na hipótese.
Nesse sentido:
HABEAS CORPUS . HOMICÍDIO. PRETENSAO DE TRANCAMENTO DA AÇAO PENAL. ALEGAÇAO DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE (LEGÍTIMA DEFESA PRÓPRIA E DE TERCEIROS). IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. EXAME QUE DEMANDA REVOLVIMENTO DO MATERIAL PROBATÓRIO.
1. É sabido que o trancamento da ação penal é medida de índole excepcional, cabível apenas nas hipóteses em que desponte, de plano, a atipicidade da conduta, a inexistência de qualquer elementoindiciário demonstrativo de autoria ou da materialidade do delito ou, ainda, causa excludente de punibilidade, não demonstradas na hipótese presente.
2. Além disso, a via estreita do habeas corpus não se compatibiliza com a pretensão ora buscada, de reconhecimento da excludente da legítima defesa. A questão há de ser apurada no bojo da instrução criminal,quando será assegurada a ampla produção de provas.
3. Ordem denegada.
(HC-55.502/CE, de minha Relatoria, DJe de 7.6.10.)
HABEAS CORPUS . PENAL E PROCESSUAL PENAL. PECULATO. PRESCRIÇAO ANTECIPADA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. PLEITO DE TRANCAMENTO DA AÇAO PENAL EM RAZAODO RECONHECIMENTO DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE. IMPOSSIBILIDADE. TIPO DOLOSO. AUSÊNCIA DE PREVISAO LEGAL.
1. O Superior Tribunal de Justiça tem aplicado, reiteradamente, o entendimento de que não é possível o reconhecimento da prescrição "antecipada", ou "em perspectiva", ou "virtual", considerando-se a pena a ser aplicada no futuro, por não ter sido albergada pelo ordenamento jurídico pátrio.
2. O trancamento de ação penal pela via estreita do habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca e sem a necessidade de valoração probatória, a inexistência de autoria por parte do indiciado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade, circunstâncias não constatadas na hipótese.
3. A reparação do dano antes do recebimento da denúncia não exclui o crime de peculato doloso, diante da ausência de previsão legal. Poderá influir, no entanto, quando da fixação da pena, nos termos do art. 16 doCódigo Penal.
4. O tipificação do delito de peculato não possui cunho exclusivamente patrimonial, objetiva, outrossim, o resguardo da probidade administrativa.
5. Ordem denegada.
(HC-88.959/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 6.10.08.)
Em relação à alegação de violação à ampla defesa, consubstanciado na ausência de defesa efetiva e no fato do paciente não haver comparecido às audiências, o pedido, igualmente improcede.
Em primeiro lugar, esse fato não foi alegado, em momento algum no processo e, consequentemente, não foi analisado nem pelo Juiz e nem pelo Tribunal.
Em segundo lugar, compulsando os documentos trazidos pelo impetrante verifico que o paciente, que se encontrava preso em Ilhéus/BA, foi requisitado para interrogatório, que se efetivou no dia 10.11.95 (fl.279), oportunidade em que estavam presentes o paciente e seu advogado constituído Dr. Luiz Paulo Damasceno Varjão (fl. 286).
Esse mesmo advogado apresentou defesa prévia e arrolou 3 (três) testemunhas (fl. 291).
As audiências foram precedidas de prévia intimação do seu advogado, consoante despacho do magistrado à fl. 294:
Designo dia (...) para ouvida das testemunhas arroladas na denúncia. façam-se as devidas intimações. Notifiquem-se o MP e o Defensor dos acusados.
Depreende-se dos autos, ainda, à fl. 324, a existência de documento da autoridade policial que atesta a apresentação do paciente para a realização da audiência de oitiva das testemunhas e, no dia 1º.4.96, o referido ato processual realizou-se com a presença do advogado que, na oportunidade, participou ativamente da audiência com a formulação de perguntas .
Assim, com observância estrita da ampla defesa , seguiu-se todo o curso do processo sendo que, na fase das alegações, foram apresentados memoriais pela defesa, impugnando, de maneira pontual, a acusação.
Dessarte, não verifico, sob nenhum ângulo, a ocorrência da alegada nulidade por violação a ampla defesa.
De mais a mais, havendo a presença do defensor do acusado, eventual não comparecimento do próprio acusado na audiência de oitiva de testemunhas o que, repito, não ocorreu constitui nulidade relativa, consoante jurisprudência desta Corte:
HABEAS CORPUS . ROUBO CIRCUNSTANCIADO. NULIDADE. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇAO. NAO COMPARECIMENTO DOS RÉUS. PRESENÇA DO DEFENSOR. DEFESA E CONTRADITÓRIORESPEITADOS. EIVA RELATIVA. PREJUÍZO NAO DEMONSTRADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NAO EVIDENCIADO.
1. Consolidou-se na jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a ausência física do denunciado em audiência de oitiva de testemunhas, na qual compareceu o seu defensor, somente é causa de nulidade processual se comprovado o prejuízo oriundo do seu não comparecimento ao ato, ou seja, cuida-se de nulidade relativa.
2. Inviável acolher-se a eiva articulada se não restou demonstrado nos autos que o ato procedido na sua ausência acarretou prejuízo à defesa, requisito indispensável para o reconhecimento da mácula segundo oprincípio do pas de nullité sans grief, positivado no art. 563 do CPP.
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4. Ordem parcialmente concedida para estabelecer o regime semiaberto como modo inicial de cumprimento da sanção aplicada ao paciente.
( HC-155.113/SP, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 9.8.10.)
HABEAS CORPUS . "OPERAÇAO PLAYBOY". TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS, ASSOCIAÇAO PARA O TRÁFICO E QUADRILHA. AUSÊNCIA DE REQUISIÇAO. RÉU PRESO EM COMARCA DIVERSA. AUDIÊNCIA DE OITIVA DE TESTEMUNHAS DE ACUSAÇAO. NULIDADE RELATIVA. NECESSIDADE DECOMPROVAÇAO DE PREJUÍZO. COMPARECIMENTO DE ADVOGADO CONSTITUÍDO. VIOLAÇAO AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.
1. Segundo o pacífico entendimento desta Corte, a falta de requisição de réu preso em comarca diversa para a audiência de oitiva de testemunhas de acusação constitui nulidade relativa, sendo indispensável a comprovação de prejuízo.
2. "Não há falar em violação aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, pela ausência do réu na audiência de inquirição das testemunhas, uma vez que exercida de maneira plena pelo advogado regularmente constituído presente ao ato processual."
3. Ordem denegada.
(HC-79.080/SP, Relator Ministro Arnaldo Esteves, DJe de 26.5.2008).
Por fim, a alegação de que a condenação do paciente se deu por vingança ou perseguição do magistrado não veio amparada com qualquer elemento de convicção que permitisse o seu exame pela via escolhida.
Por tais fundamentos, conheço parcialmente da ordem e nessa extensão, a denego.

Exercício legal do direito

No caso do exercício legal do direito trata-se de uma ação que deve ser praticada pelo sujeito, que consta na legislação, mas que está caracterizada, se não praticada com as prerrogativas impostas pelo código, como fato típico E antijurídico – fato esse que se modifica se se enquadrar na hipótese do art. 23 CP.
São exemplos: o particular que efetua prisão em flagrante, a coação pra evitar o suicídio ou a prática de intervenção cirúrgica.
Tais prerrogativas podem ou não constarem na Lei Penal, pode constar nas leis extrapenais. De qualquer forma, elas não devem ser desrespeitadas pelo simples fato de não estarem dentro do Código Penal.
Vale lembrar ainda que a Constituição traz, em seu artigo 5º, II, que ninguém será obrigado a fazer alguma coisa senão em virtude de lei, o que caracteriza então uma FACULDADE ao sujeito, que poderá ou não agir, e que estará ciente de que se agir, não será punido.
Para Mirabete, “a excludente pressupõe no executor um funcionário ou agente público que age por ordem da lei, não se excluindo o particular que exerça função pública (jurado, perito, mesário da Justiça Eleitoral etc.). Estão abrigados pela justificativa o policial que cumpre um mandado de prisão, o meirinho que executa o despejo e o fiscal sanitário que são obrigados à violação de domicílio, o soldado que executa por fuzilamento o condenado ou elimina o inimigo no campo de batalha etc. Agem em estrito cumprimento do dever legal os policiais que empregam força física para cumprir o dever (evitar fuga de presídio, impedir a ação de pessoa armada que está praticando um ilícito ou prestes a fazê-lo, controlar a perturbação da ordem pública etc.).”
Alguns doutrinadores afirmam que o exercício regular de direito nada mais é do que uma conduta autorizada por lei, tornando lícito determinado fato típico.
Consta do artigo 23 do CP:
Jurisprudência:
Processo:
2008.003261-6



Julgamento:
09/07/2009
Órgao Julgador:
Câmara Criminal
Classe:
Apelação Criminal (Detenção)


Acórdão nº                    : 8.461
Classe                            : Apelação Criminal (Detenção) nº
Origem                           : Tarauacá/Vara Única Criminal
Órgão                            : Câmara Criminal
Relator                           : Des. Arquilau Melo
Apelante                        : Marceliane Enéas de Carvalho
Advogado                      : José Lucivan Nery de Lima
Apelado                         : Ministério Público do Estado do Acre
Promotor de Justiça        : Março Aurélio Ribeiro
Objeto da Ação             : Penal. Lesão Corporal de Natureza Grave.
APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 129, § 9º, DO CÓDIGO PENAL. ABSOLVIÇÃO EM RAZÃO DO EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. IMPROCEDÊNCIA. ABUSO DO JUS CORRIGENDI . DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE MAUS TRATOS. POSSIBILIDADE. EXCESSO INCONVENIENTE NOS MEIOS DE CORREÇÃO E DISCIPLINA.
1. É descabida a absolvição pelo exercício regular de direito quando este se dá de forma abusiva ou excessiva, de modo que se a genitora da menor lhe causou lesões graves por ultrapassar os limites do jus corrigendi , é de rigor que sofra as consequências legais.
2. Restando clarividente que a intenção da ré era de corrigir a filha de apenas 02 (dois) anos de idade, abusando, portanto, deste direito com excesso inconveniente dos meios utilizados, justifica-se a imposição de nova definição jurídica ao fato, para condená-la nas penas referente ao delito de maus tratos (artigo 136, § 3º, do CP).
3. Recurso a que se dá parcial provimento.
Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Criminal (Detenção) nº , em que figuram como apelante Marceliane Enéas de Carvalho e  apelado Ministério Público do Estado do Acre, ACORDAM, por maioria, os membros da Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Acre, dar  provimento parcial ao apelo, nos termos do voto do relator e notas taquigráficas arquivadas.
Sem custas.
Rio Branco, 09 de julho de 2009.
             Des. Francisco Praça                                                     Des. Arquilau Melo
             Presidente, em exercício                                                               Relator
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Arquilau Melo, relator : Marceliane Enéas de Carvalho interpôs recurso de apelo (fls. 87/88) contra sentença (fls. 81/85) proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Criminal da Comarca de Tarauacá, que a condenou como incursa no crime do artigo129, § 9º, do Código Penal, à reprimenda de 06 (seis) meses de detenção, em regime aberto, substituída a pena privativa de liberdade por restritiva de direito na modalidade de prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo período da condenação, a título de oito horas semanais.
Narra a exordial acusatória (fls. 02/04), no dia 21 de fevereiro de 2008, por volta das 12h30min., na Avenida Tancredo Neves, nº 1040, Bairro Centro, na Cidade de Tarauacá, a denunciada, com uma sandália, ofendeu a integridade física da vítima Kéven de Carvalho Rodrigues, seu filho de apenas 02 (dois) anos de idade, causando-lhe lesões de natureza grave, resultando em perigo de vida (laudo de exame de corpo de delito, fls. 13).
Narra, ainda, que no dia do evento criminoso, a criança tinha defecado dentro de casa quando então a denunciada pegou a sandália e agrediu violentamente seu filho. Nesse instante, a avó materna buscou socorro perante o Conselho Tutelar, sendo a denunciada presa em flagrante delito pelos agentes de proteção.
Em suas razões recursais (fls. 92/95) requer a defesa a absolvição da apelante, alegando a excludente de ilicitude do exercício regular de direito, previsto no artigo 23, inciso III, do Código Penal. Subsidiariamente, pleiteia a desclassificação para o crime de maus tratos, estabelecido no artigo 136, do Código Penal.
Em contra-razões recursais (fls.100/112), sustenta a acusação, preliminarmente, a intempestividade recursal e, no mérito, rechaçou os argumentos da defesa, pugnando pelo improvimento do apelo.
A Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer (fls. 118/121), manifestou-se  pelo conhecimento e parcial provimento do apelo, para desclassificar o delito para o crime previsto no artigo 136, § 3º, doCódigo Penal.
É o relatório.
VOTO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Arquilau Melo, relator :Inicialmente, defiro o pedido de assistência judiciária, conforme se afere da declaração de hipossuficiência (fls. 89) e nos termos do artigo , parágrafo único, da Lei 1.060/50, com alterações advindas com a Lei 7.510/86.
Ademais, pertinente à tempestividade, é cediço que os prazos recursais sujeitam-se a dois grandes princípios, quais sejam, da inteireza dos prazos e o de sua interposição em benefício do recorrente. Nessa senda, tendo em vista que a ré somente foi intimada da sentença no dia 26.09.2008 (fl. 97 v.) e o recurso interposto na data de 29.09.2008 (fl. 87), não há que se falar em intempestividade. Precedentes STF [1] .
Quanto ao mérito, pretende a apelante a sua absolvição, com fundamento na excludente de ilicitude do exercício regular de direito, alegando, para tanto, que somente aplicou a correção na criança como forma de discipliná-la.
Entretanto, o apelo não merece prosperar, eis que, para a configuração desta excludente, necessário se faz que o exercício de seu direito não seja abusivo ou excessivo, e não é isto o que se vislumbra dos autos, especificamente dos anexos fotográficos (fls.48/53), do laudo de exame de corpo de delito (fls. 17) e laudo de exame complementar (fls. 60), evidenciando as lesões sofridas pela criança, de apenas 02 (dois) anos de idade, com diversas marcas do chinelo pelo corpo, causando lesões maiores do que seria necessário para o jus corrigendi . Desta forma, não se reconhece a excludente de ilicitude.
No que tange à desclassificação do crime de lesão corporal para o crime de maus tratos, este último caracteriza-se quando o agente utiliza de modo excessivo e inconveniente os meios de correção ou disciplina. De certo, atua o agente com o animus corrigendi, entretanto, abusa deste direito que lhe é conferido.
Nesse sentido, leciona Rogério Greco [2] :
"Assim, os pais não estão impossibilitados de corrigir seus filhos moderadamente, mas, sim, completamente proibidos de abusar desse direito, sob pena de serem responsabilizados criminalmente".
É o que se depreende do caso concreto, mormente quando a genitora, ora apelante, declarou (fl. 09):
"... que a imputada confessa o delito, dizendo que no dia 21 do mês de fevereiro do ano de dois mil e oito, por volta das 12h00min horas, peguei uma sandália e com esta eu dei uma pisa em meu filho, pelo motivo de haver o mesmo feito coco, no meio da casa. Que a imputada diz que o fez porque se descontrolou, mas não tinha a intenção de causar ao mesmo lesões corporais grave..."
Desta feita, decorrente da devolução da matéria impugnada e atinente ao que estabelece o artigo383, do Código de Processo Penal, dar-se-á ao fato definição jurídica diversa da que constou na sentença, estando a apelante como incursa no artigo 136, § 3º, do Código Penal.
E, observando o que estabelece o artigo 59 e 68, ambos do Código Penal, estabeleço a dosimetria da pena, adotando a motivação exarada pelo magistrado singular, a qual colaciono:
" A culpabilidade da ré é incontestável, pois é imputável, tinha consciência da ilicitude de seu ato, lhe era perfeitamente possível a prática de conduta diversa, porquanto teve oportunidade de evitar o delito, já que foi a causadora do fato em si, mas assim não o fez. A ré não registra antecedentes criminais. No tocante à conduta social da agente, esta deve ser valorada em seu favor. A sua personalidade não pode ser aferida pelos elementos contidos nos autos, mas é capaz de compreender o caráter ilícito de suas ações e, portanto, de agir conforme esse entendimento. Já as circunstâncias do crime revelam o caráter reprovável da conduta erigida pelo agente, pois as lesões causadas à vítima foram originadas por motivo fútil. As conseqüências foram graves, as lesões causadas na pequena vítima deixam seqüelas, causando transtornos face sua tenra idade, influenciando negativamente na formação de sua personalidade. A vítima, com o seu comportamento, não contribuiu para a ocorrência do delito".
           
Desta forma, aplico a pena-base em seu mínimo legal, em 02 (dois) meses de detenção, fazendo-se incidir a causa de aumento prevista no § 3º do artigo 136, do Código Penal, perfazendo-se em 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de detenção.
Atendendo-se ao artigo 65, inciso III, alínea "d" (confissão espontânea), do Código Penal, reduzo a pena em 20 (vinte) dias, tornando-a concreta e definitiva em 02 (dois) meses de detenção e, estando presente os requisitos do artigo 44, incisos I, II e III, e § 2º, primeira parte, todos do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direito, na modalidade de prestação de serviços à comunidade na Pastoral da Criança da Comarca de Tarauacá/AC, pelo mesmo tempo da condenação, nos termos a ser designado pela CEPAL.
Diante do exposto, voto pelo conhecimento e parcial provimento do apelo, para desclassificar o delito para o crime do artigo 136,§ 3º, do Código Penal, nos termos da fundamentação.
Sem custas.
É como voto.
DECISÃO
Conforme consta da certidão de julgamento a decisão foi a seguinte:
"Decide a Câmara, por maioria, dar provimento parcial ao apelo nos termos do voto do relator. Divergente o Desembargador Francisco Praça. Câmara Criminal - 09.07.2009."
Participaram do julgamento, pela ordem de votação, os Desembargadores Francisco Praça, Arquilau Melo e Izaura Maia, membro da Câmara Cível, convidada a compor o quorum , ante a ausência do Desembargador Feliciano Vasconcelos, em gozo de férias.
O referido é verdade e dou fé.
Rio Branco, 09 de julho de 2009.
Belª Oliete Cruz de Almeida
Secretária

Causas Supralegais

Dentro das causas excludentes, existem algumas que não constam na legislação penal, e que por isso são chamadas causas ‘supralegais’.
Há casos em que há a exclusão da culpabilidade, que é o caso da inexigibilidade de conduta diversa, e outros em que há a exclusão da ilicitude, como o consentimento do ofendido, que é o tema deste trabalho.
É admitido dentro do ordenamento brasileiro tal causa, a qual trata-se de consentimento do ofendido em sofrer tal dano. Para que possa efetivamente haver o consentimento, é necessário que sejam preenchidos alguns requisitos:
·                   Tem que haver na discussão bem jurídico disponível;
·                   Capacidade para consentir;
·                   Anterioridade do consentimento;
·                   Atuação nos limites do consentimento.

Segundo Zitelman, que construiu sua teoria embasado nos §§ 182 e ss do Código Civil Alemão, o consentimento do ofendido é uma espécie de negócio jurídico, tendo em vista que cada um pode, dentro de certos limites, permitir determinadas atitudes com relação a seu bem (Teoria do Negócio Jurídico).
Se o consentimento for entendido, portanto, como negócio jurídico, haverá assim a excludente, por o ato ilícito ter sido aceitado pelo suposto “ofendido”.
Pode-se entender, então, que o bem jurídico ofendido já não possui “tanta importância” ao seu titular. Logo, não há que se falar em ilicitude, já que o fato típico não deixa de existir, mas a antijuridicidade não está presente, pois o suposto ofendido concordou que tal fato fosse praticado.
Não se pode esquecer ainda que deve haver certa ponderação com relação ao valor do bem cedido.
Numa segunda linha sobre o tema, há a ideia de renúncia do ofendido em obter a proteção do Direito Penal, quando ele permite tal ofensa, e não quer vê-  -la punida.
Pressupondo o abandono do bem em questão, o Estado deixaria de ter o jus puniendi por puro desinteresse, numa terceira tentativa de justificar a existência desta causa como excludente.
Jurisprudência:
Dados do acórdão
Classe:
Apelação Criminal
Processo:
2008.064495-4
Relator:
Irineu João da Silva
Data:
2009-05-20
Apelação Criminal n. , de Sombrio
Relator: Des. Irineu João da Silva
CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. ESTUPRO. VIOLÊNCIA PRESUMIDA. VÍTIMA COM 13 (TREZE) ANOS. CONSENTIMENTO DA OFENDIDA. IRRELEVÂNCIA. EXAME DE CONJUNÇÃO CARNAL. PALAVRAS DA VÍTIMA COERENTES COM OS DEMAIS ELEMENTOS PROBATÓRIOS CONTIDOS NOS AUTOS. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO MINISTERIAL PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. , da comarca de Sombrio (2ª Vara), em que é apelante a Justiça Pública, por seu promotor, e apelado Ronaldo Ferreira:
ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para condenar Ronaldo Ferreira, nos termos deste acórdão. Custas legais.
RELATÓRIO
O representante do Ministério Público oficiante na Comarca de Sombrio (2ª Vara) ofereceu denúncia contra Ronaldo Ferreira, como incurso nas sanções do art. 213, "caput", c/c os arts. 224, a, e 226, II, todos do CP, pelos seguintes fatos descritos na proemial acusatória (fls. I/II):
No mês de agosto de 2004, A. da S. Q., que naquela época contava com 13 ( treze) anos (vide fotocópia da carteira de identidade à fl. 11), laborou como babá da filha do denunciado em sua antiga residência, localizada na Rua José Joaquim Cardoso, 1558, São Pedro, Sombrio/SC.
A infante, iludida pelo denunciado, acreditou que ele gostava dela, passando a "namorá-lo", relação reciprocamente correspondida e que se consumava na troca de beijos e abraços.
Em certo dia do mês de agosto, porém, o denunciado, desejando ir mais longe na relação, constrangeu a vítima, mediante violência presumida, à conjunção carnal, conforme evidenciado no exame acostado à fl. 8 dos autos.
Concluída a instrução criminal, a denúncia foi julgada improcedente, para absolvê-lo, com fulcro no art.386, VI, do CPP (fls. 94/104).
Inconformado com a prestação jurisdicional, o Ministério Público apelou, requerendo a reforma da decisão, para condenar o apelado nos termos da exordial acusatória (fls. 115/125).
Com as contra-razões (fls. 131/137), nesta Instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Demétrio Constantino Serratine, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do apelo (fls. 143/146).
VOTO
O recurso interposto pelo representante do Ministério Público deve ser conhecido, porque próprio e tempestivo, merecendo provimento.
Pelo que se extrai do processado, o apelado Ronaldo Ferreira manteve relacionamento com a menor M. da S. Q., durante o período em que ela trabalhou em sua casa, inclusa relação sexual, desvirginando-a.
Nesse contexto, tem-se que a materialidade do crime de estupro está comprovada pelo auto de exame de corpo-delito (conjunção carnal), atestando a ocorrência de cópula vagínica, inclusive, com a ruptura do hímen (fl. 8).
Na fase policial, o acusado reservou-se no direito de prestar declarações somente em juízo (fl. 18), e, perante o magistrado, negou a autoria, alegando que, na época em que A. trabalhou em sua residência, namorava uma prima dela, de 23 ou 24 anos. Disse, ainda, que, seguidamente, via rapazes nas proximidades de sua casa e que um deles foi visto por sua filha beijando a ofendida, não sabendo porque estava sendo acusado (fl. 50).
Por sua vez, a vítima, M. da S. Q., em todas as oportunidades em que prestou declarações (quatro vezes), confirmou o relacionamento amoroso com o acusado, contando que, durante o período em que trabalhou na casa do réu, eles mantiveram relação sexual e que isso nunca havia ocorrido com outra pessoa, tampouco teve namorados. No mais, falou que se apaixonou por Ronaldo e que cedeu diante de sua insistência para fazerem sexo, contando, em detalhes, como o crime ocorreu, inclusive, que sangrou e sentiu dor (fls. 12, 17, 38 e 65).
A par dessas declarações, têm-se, ainda, os dizeres do pai da adolescente, contando que, em 20.4.2004, recebeu três telefonemas anônimos de rapazes que diziam que o réu havia confidenciado que transou com a vítima. Então, pressionou a filha e ela admitiu que manteve relação sexual com o acusado enquanto trabalhou na casa dele, chamando a conselheira tutelar para orientá-los (fls. 16 e 63).
A Conselheira Tutelar Cirlei Aparecida da Silva acompanhou a menor para fazer o exame de conjunção carnal e disse que, nessa ocasião, a vítima contou que viveu um romance com Ronaldo e eles mantiveram relações sexuais, sendo que terminaram o relacionamento porque ele voltou a conviver com a esposa (fls. 13 e 64).
Por sua vez, a conselheira Dilane Freitas afirmou que a ofendida disse que o réu forçou um pouco a realização do coito, o que ocorreu uma só vez, acreditando que ela, certamente, teria mantido outras relações sexuais, mas não quis comentar o assunto porque estava na presença dos pais. Por fim, consignou que a menor somente revelou os fatos porque seu pai recebeu telefonemas anônimos (fl. 14).
A informante Taíse de Quadros, prima da ofendida, disse que ela revelou que manteve relação sexual com Ronaldo e nunca a viu com namorado, pois seu pai era bastante rigoroso (fl. 39).
Como se vê, não obstante a negativa do réu, o delito restou plenamente configurado, não só pelas palavras enfáticas da ofendida, como, também, pelo laudo pericial, o qual constatou a conjunção carnal, não pairando dúvidas sobre a conduta ilícita praticada pelo apelado.
Todavia, o ponto em questão é a existência de consentimento da vítima, o que fez com que o réu fosse absolvido, sustentando o magistrado que a ofendida já era uma adolescente, com maturidade sexual, anuindo para a prática das relações sexuais, e que ela apenas trouxe os fatos à tona por vingança, porque o réu a abandonou, descaracterizando o crime de estupro, já que se trata de presunção relativa de violência.
No entanto, na espécie, o fato de existir consentimento é totalmente inócuo, dada a idade da ofendida (13 anos), consoante comprova a Carteira de Identidade de fl. 11, circunstância, inclusive, conhecida do acusado.
"Data venia" de entendimento contrário, em matéria de violência ficta, por ser a vítima menor de 14 anos, como no caso, não há que se cogitar da real coação ou constrangimento, pois o próprio legislador quis se considerasse como havida violência contra aqueles sujeitos elencados no art. 224, alíneas a, b, e c, exatamente pela condição de inferioridade física, emocional e de autodeterminação que lhes é inerente. Sabido é que a doutrina empresta valor relativo, e não absoluto, à presunção, podendo esta ceder se, por exemplo, a menor tinha vida desregrada, ou outra condição que levasse o agente a pressupor que seu comportamento implicasse livre arbítrio sobre os atos praticados. Mas tal não alcança a situação em apreço. Querer desconstituir a incapacidade da criança para perceber os contornos luxuriosos do relacionamento, atribuindo-lhe responsabilidades pelo envolvimento libertino, é pretender tenha uma menina de 13 (treze) anos capacidade para constituir uma relação amorosa, com suas implicações sexuais, coisa que muitos adultos têm dificuldade de fazê-lo, a contento.
É da natureza infanto-juvenil, sobretudo, feminina, idealizar, com romantismo, o relacionamento afetivo, projetando, na esfera das fantasias, um ideal de parceiro, uma vida repleta de sonhos. Mesmo entre as jovens oriundas das camadas mais desfavorecidas da população essas fantasias são recorrentes e servem, no mais das vezes, como subterfúgio para atenuar a dura realidade em que vivem.
Da jurisprudência:
O consentimento da menor de 14 anos não tem relevo, nem pode elidir a configuração do crime de estupro. Irrelevante, também, partir ou não da vítima a iniciativa ou provocação para o ato sexual. A menos que se trate de pessoa de vida inteiramente dissoluta, a presunção de violência prevalece, porque o consentimento da menor não se pode ter por consciente e válido, traduzindo um querer espontâneo, livre e cabal (RJTJSP 4/303).
E, desta Corte de Justiça:
CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL - ESTUPRO - CONFISSÃO DO RÉU E PALAVRA DA VÍTIMA - PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO - VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS DE IDADE - VIOLÊNCIA PRESUMIDA - CONSENTIMENTO DA OFENDIDA - IRRELEVÂNCIA - "INNOCENTIA CONSILII" CARACTERIZADA - RECURSO DESPROVIDO.
A presunção de violência, por ser a vítima menor de 14 anos, tem fundamento na proteção daqueles que, em virtude da pouca idade, ainda não possuem a exata noção das conseqüências de seus atos, de modo que, sem o pleno domínio da vontade, considera-se inválida a anuência emprestada ao relacionamento sexual.
Embora relativa, a presunção de violência do art. 224, letra a, do Estatuto Repressivo, só poderá ser infirmada se houver prova de que a vítima já era de todo corrompida, ao tempo da conjunção carnal com o agente (Ap. crim. n. 02.000334-4, de Correia Pinto, rel. Des. Jaime Ramos, j. 6.8.2002).
Nesse contexto, não há que se dar guarida ao argumento de que a vítima, uma menina de 13 anos de idade, de um município do interior, inexperiente e curiosa com as coisas do sexo, que não possuía formação moral e de caráter consolidadas, tenha consentido validamente para a prática das relações sexuais, a pretexto de desclassificar a presunção de violência. Por outro lado, o acusado, Ronaldo Ferreira, na época com 36 anos, não sendo pessoa ingênua, deveria saber que não poderia levar adiante a situação, pois, como já foi repisado, a lei reputa inválido o consentimento de certas pessoas, em razão da idade ou condição mental em que se encontram, não cabendo discutir sua aquiescência sobre fatos sexuais.
Cita-se precedente que bem se amolda ao caso em tela:
O que deve ser considerado é que uma menina de doze anos não possui suficiente capacidade para consentir livremente na prática de coito. É que uma menina de 12 anos, já se tornando mulher, o instinto sexual tomando conta de seu corpo, cede, com mais facilidade, aos apelos amorosos. É precária sua resistência, natural mesmo sua insegurança, dado que não têm ela, ainda, condições de avaliar as conseqüências do ato. O instinto sexual tende a prevalecer. Por isso, a lei instituiu, em seu favor, a presunção de que foi levada à consumação do ato sexual mediante violência (Código Penal, art. 224, a). A afirmativa no sentido de que a menor era leviana não me parece suficiente para retirar-lhe a proteção da lei penal. Leviana talvez o seja, porque imatura, não tem condições de discernir livremente. Uma menina de doze anos está, indiscutivelmente, em formação, não sabe ainda o que quer. (.) O paciente é que, com 24 anos de idade, deveria ter pensado duas vezes antes de realizar o coito. (...) Na verdade, uma jovem de 12 anos não é ainda uma mulher, não sabe discernir a respeito de seus instintos sexuais. Essa imaturidade, que impede a compreensão do exato sentido do ato, revela-se, justamente, nas declarações que foram prestadas, em que a menina-moça se preocupa em parecer mulher de vida livre. Isto decorre da imaturidade. Fosse ela mulher feita, pudesse ela discernir como adulta, e suas declarações seriam outras, ela tentaria se defender, parecer moça austera, circunspecta" (STF, HC 73.662, MG, rel. Min. MARÇO AURÉLIO, j. 21.05.1996).
Em síntese: nos crimes contra a liberdade sexual cometidos contra menores de quatorze anos, o consentimento da vítima é irrelevante, presumindo-se a sua incapacidade absoluta de decidir quanto à oportunidade e conveniência da relação carnal.
Assim, restando comprovada a materialidade do estupro pelo auto de conjunção carnal, bem como a autoria pelas palavras da vítima, a condenação do apelado é medida que se impõe.
Por fim, dando provimento ao recurso do Ministério Público para condenar o réu nas sanções do art.213, c/c art. 224, a, ambos do CP, passa-se à aplicação da pena:
Atendendo-se às circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, tem-se a culpabilidade em grau médio. Inexistem elementos nos autos para a segura análise de sua conduta social e personalidade. Não registra antecedentes criminais. Os motivos e as circunstâncias foram normais à espécie. As conseqüências não foram graves, uma vez que a ofendida, apesar de se dizer magoada, após os fatos, levava uma vida normal. Quanto ao comportamento da vítima, não se pode dizer que contribuiu para a prática do delito.
Assim, pela análise das circunstâncias judiciais, fixa-se a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 6 (seis) de reclusão.
Na fase intermediária, não há agravantes ou atenuantes a serem sopesadas.
Na terceira fase, inexistem causas de aumento ou de diminuição.
Finalmente, em que pese os autos indicarem que a vítima manteve multiplicidade de eventos carnais com o réu, em juízo ela afirmou que isso ocorreu uma única vez, impossibilitando o reconhecimento da continuidade delitiva.
O regime inicial de cumprimento da reprimenda deve ser o semi-aberto (art. 33, § 2º, b, do CP).
Em virtude do montante da pena aplicada, impossível a substituição da pena corporal por restritivas de direitos ou "sursis".
DECISÃO
Diante do exposto, decidiu a Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para condenar Ronaldo Ferreira, nos termos desde acórdão.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Sérgio Paladino, sem voto, e dele participaram os Exmos. Srs. Des. Salete Silva Sommariva e Tulio José Moura Pinheiro, lavrando parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Demétrio Constantino Serratine.
Florianópolis, 7 de abril de 2009.
Irineu João da Silva
Relator
Gabinete Des. Irineu João da Silva
São citados ainda, por Flávio Augusto Monteiro Barros outras excludentes, as quais seriam: o Princípio da Adequação Social, Princípio do Balanço dos Bens e o Princípio da Insignificância ou Bagatela.
Este último tem sido aceito em nossa jurisprudência, e leva em consideração o valor do bem, analisando a proporcionalidade do dano sofrido pelo ofendido e a pena que deveria ser imposta. Vejamos:
HABEAS CORPUS Nº 21.071 - SP (2002/0025061-6)
RELATORA
:
MINISTRA LAURITA VAZ
IMPETRANTE
:
FAIÇAL CAIS
IMPETRADO
:
DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DA AÇAO PENAL NR 200003000105877 DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIAO
PACIENTE
:
RODRIGO GARCIA
EMENTA
HABEAS CORPUS . DESCAMINHO. APREENSAO DE MERCADORIA DE PEQUENO VALOR. INEXISTÊNCIA DE INTERESSE FISCAL. APLICAÇAO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CAUSA SUPRALEGAL DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE. PRECEDENTES DO STJ.
1. Não se vislumbra na hipótese a existência de ilícito fiscal, o que se torna inviável a imputação do delito de descaminho ao paciente, uma vez que a conduta que se lhe imputa a peça acusatória não chegou a lesar o bem jurídico tutelado, qual seja, a Administração Pública em seu interesse fiscal.
2. Aplicação do princípio da insignificância como causa supralegal de exclusão da tipicidade. Precedentes do STJ.
3. Habeas corpus concedido.
ACÓRDAO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder a ordem pleiteada pela defesa, para determinar o trancamento da ação penal originária nº 2000.03.00.010587-7, em trâmite no Tribunal Regional Federal da Terceira Região. Votaram com a Relatora os Ministros José Arnaldo da Fonseca, Felix Fischer, Gilson Dipp e Jorge Scartezzini.
Presidiu a sessão o Ministro Gilson Dipp.
Brasília (DF), 11 de fevereiro de 2003 (data do julgamento).
MINISTRA LAURITA VAZ
Relatora

Ou seja, pode-se dizer que atualmente estão sendo aceitas as excludentes de antijuridicidade que sejam supralegais no ordenamento jurídico brasileiro.

Diferenciações

Excludentes
Legítima Defesa
Estado de Necessidade
Estrito Cumprimento de Dever Legal
Exercício Regular de Direito

agressão Injusta
perigo não provocado voluntariamente pelo agente
o agente está obrigado a agir, porque a lei assim impõe
o agente age praticando fato típico, mas não ilícito porque a lei o permite

atual ou iminente
atual
fato típico mas não antijurídico
deve obedecer os limites impostos

moderação nos meios de defesa

consciência de que está agindo em legítima defesa
consciência de que está agindo em estado de necessidade
deve respeitar os limites ao seu cumprimento


direito próprio ou alheio
direito próprio ou alheio



reação
ação
obrigação
FACULDADE




Questão 02: Causas supralegais são admitidas no sistema jurídico brasileiro?

 No sistema jurídico Brasileiro admitem-se causas excludentes de ilicitudes não previstas em lei? Fundamente sua resposta, indicando todas as posições doutrinárias sobre o tema.

Sim, embora haja uma discussão acerca da validade de tais justificantes, tendo em vista o fato de termos um ordenamento jurídico positivista, que exigiria, portanto, a existência da excludente (atualmente supralegal) dentro do sistema.
Mesmo com tais discussões, e até mesmo o uso escasso de tais exculpantes, elas se encontram presentes no ordenamento.
A causa excludente supralegal que temos presente em nosso dia-a-dia é o consentimento do ofendido, tema já citado e explicado supra, e que é vastamente confundido com o exercício regular de direito.
A faculdade dos dois fatos é o que acaba fazendo ser confundido.
Consentir é uma faculdade. Se o consentimento tiver como corolário um bem jurídico disponível não há que se falar em ilicitude. Quando um exercício de direito tem raiz no direito penal, o fato pode ser ilícito na esfera extrapenal, embora não seja ilícito punível.
Destarte, como foi mostrado, se o consentimento estiver sendo empenhado sob bem jurídico disponível exclui-se a ilicitude. Não seria razoável que A permitisse que B adentrasse em sua residência e após uma discussão A acusa B de violação de domicílio. O consenso não pode ser aplicado a crimes contra a vida, liberdade, honra e administração pública.
José Frederico Marques diz:
“Quando surge o consenso, em relação a determinados bens deixa de subsistir a situação de fato em relação à qual deve entrar em vigor a norma penal, o que acontece naqueles casos em que o interesse do Estado não seja tão que prescinda da vontade do particular. É que, em ocorrendo tais situações, o interesse público do Estado não pode exigir mais do que isto: que os bens individuais não sejam atingidos contra a vontade de respectivos sujeito  O interesse estatal de identifica com a conservação de bens individuais enquanto seta corresponda à vontade do titular; consequentemente esses bens não podem ser tidos como lesados quando o respectivo sujeito manifestou sua vontade em sentido favorável à lesão.”
(...)
“A disponibilidade ou indisponibilidade do bem jurídico é problema que se resolve em face dos mandamentos, princípios e regras da ordem jurídica total, inclusive o direito costumeiro.”

Questão 03: Responsabilidade Civil e Administrativa por fato criminal.


 José, policial militar, foi absolvido no Tribunal de Juri por ter praticado o fato em legítima defesa. A decisão do campo penal afasta também a responsabilização civil e a administrativa do policial? Fundamente sua resposta.
Observe o conceito de José Carlos Gobbis Pagliuca:

“A exclusão de antijuridicidade não implica o desaparecimento da tipicidade e deve-se falar em ‘conduta típica permitida’. Daí por que ser inerente às causas de exclusão da antijuridicidade o desaparecimento de quaisquer conseqüências jurídicas, quer no campo penal, civil, administrativo ou outro qualquer.”
Isso quer dizer que se o agente que cometeu o fato acobertado por um dos excludentes de antijuridicidade, ele também estará livre da responsabilidade administrativa e civil.
De acordo com o regulamento disciplinar da PM do Estado de São Paulo, as causas justificativas de transgressão são:
 “I-motivo de força maior ou caso fortuito, plenamente comprovados;                    II–benefício do serviço, da preservação da ordem pública ou do interesse público;
III-legítima defesa própria ou de outrem;
IV–obediência a ordem superior, desde que a ordem recebida não seja manifestamente ilegal;
V–uso de força para compelir o subordinado a cumprir rigorosamente o seu dever, no caso de perigo, necessidade urgente, calamidade pública ou manutenção da ordem e da disciplina”.
Ou seja, se um militar, no exercício de sua função constitucional, vier a praticar uma transgressão ao código disciplinar e esteja amparado pelas causas excludentes, ele não sofrerá sanções tanto no campo penal militar, penal, administrativo e civil.

Conclusão


O presente trabalho contribuiu e muito na compreensão das características e diferenciações existentes entre as excludentes de ilicitude, bem como compreender os casos e aplicações práticas de cada uma.
Na realidade, apesar de sabermos da dificuldade existente em ser devidamente comprovada a existência de tais causas, há de se convir que um bom profissional do Direito deve conhecer de todas as teorias e a melhor forma de aplicação de cada uma delas, tendo em vista que a qualquer momento pode ser utilizada em casos esporádicos.

Referências Bibliográficas


MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. 3ª edição.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal – Parte Geral. 12ª edição. Volume 1.
MARQUES, José Frederico. Tratado de Direito Penal. 
JESUS, Damásio Evangelista. Direito Penal – 1º volume – Parte Geral. 18ª edição.
ANDREUCCI, Ricardo Antônio. Manual de Direito Penal. 6ª edição.